A Primeira República do Brasil (1889 –
1930)
O Fim do Segundo
Reinado
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De Volta Do Paraguai: Charge publicada no jornal "A Vida Fluminanse", criticando o paradoxo vivido pelos escravos que lutaram na guerra. |
Durante o reinado de D. Pedro
II, a política imperial se destacava pelos partidos Liberal e Conservador.
Embora os partidos fossem compostos por membros da elite agrícola brasileira, a
visão a respeito do modelo de Estado era muito diferente, enquanto os
conservadores queriam a centralização do poder nas mãos do rei, os liberais
queriam maior autonomia das províncias. Ainda na segunda metade do século XIX,
uma ala radical do Partido Liberal fundou o Partido Republicano, com intenções
claras de acabar com o reinado no Brasil. Além da crise política que a criação
desse partido gerou, outras crises foram definitivas para a queda final do
imperador brasileiro.
Entre 1864 e 1870, o Brasil esteve
envolvido em uma disputa pelo controle da Bacia do Prata, conhecida como Guerra
do Paraguai. Após a vitória brasileira, os militares ganharam destaque
nacional, porém, não ganharam reconhecimento político gerando conflitos entre
os militares e o imperador. Além disso, como a maioria dos soldados brasileiros
eram afrodescendentes, esperava-se que, como forma de reconhecimento, o
imperador abolisse a escravidão, o que não aconteceu, aumentando ainda mais o
descontentamento militar com D. Pedro II.
Em 1870, o Papa Pio IX proclamou
que o papa era infalível e condenou o racionalismo, o materialismo e o ateísmo.
Em 1872, seguindo as orientações papais, bispos brasileiros ordenaram a
expulsão dos membros da maçonaria da comunidade católica. A questão gerou comoção
no meio político e jurídico brasileiro que era composto em parte por maçons
iniciando uma disputa entre o poder religioso e governamental no Brasil. A
posição de D. Pedro II em favor da maçonaria desagradou a igreja, que apesar de
ter reconsiderado a questão maçônica no Brasil, deixou de apoiar o governo
imperial.
O império brasileiro procurava
manter uma imagem de país “moderno” e “civilizado” para a comunidade internacional,
todavia, o escravismo era uma evidência inegável de atraso social brasileiro,
tanto que até mesmo o rei assumia ser o escravismo uma “vergonha nacional”.
Porém, o principal apoio político do rei vinha dos conservadores escravocratas
tornando o tema muito sensível ao reinado que pressionado pela Inglaterra e
pelos setores liberais da elite brasileira iniciou uma abolição lenta e
gradual. Em 13 de maio de 1888, pressionada pelas intenções comerciais
inglesas, pelo crescente número das comunidades quilombolas e pelo aumento
significativo do movimento abolicionista brasileiro, a princesa regente Isabel
do Brasil assinou a Lei Áurea, libertado os escravos no Brasil. Com a
escravidão abolida, a vitória republicana tornou-se questão de tempo.
Com a crise militar, os
republicanos receberam o apoio de setores importantes do exército que chegou a
criar o Clube Militar para conspirar contra o império. As crises religiosa e
abolicionista acabaram com o apoio dos conservadores que passaram a fazer duras
críticas ao imperador D. Pedro II. Assim, o movimento republicano/militar,
liderado pelo Marechal Deodoro da Fonseca, se sentiu à vontade para derrubar o
imperador proclamando a república em 15 de Novembro de 1889. É importante
destacar que o processo de proclamação da república não teve participação
popular significativa, mantendo as estruturas da elite intactas.
A República da
Espada (1889 – 1894)
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Marechal Deodoro da Fonseca |
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Marechal Floriano Peixoto |
Os primeiros anos da república
brasileira foram marcados por governos militares que fizeram uma transição do
reinado para o poder dos civis. Como os dois primeiros presidentes do Brasil,
Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto, eram marechais, esse período ficou
conhecido pelo nome de República das Espadas.
Após a proclamação da república,
os partidos Conservador e Liberal cederam lugar aos partidos republicanos que
representavam elites locais, o PRP (Partido Republicano Paulista), o PRM
(Partido Republicano Mineiro) e o PRF (Partido Republicano Fluminense)
exerceram papel de liderança durante todo o período da primeira república.
Inicialmente, o governo de
Deodoro da Fonseca (1889-1891) deveria durar somente até a conclusão da nova
constituição republicana e das eleições para colocar o poder republicano nas
mãos civis, assim, o marechal estava a cargo de um Governo Provisório. Durante
o mandato do primeiro presidente, as elites locais se fortaleceram conquistando
maior autonomia (federalismo), no entanto, a má administração econômica e o
conservadorismo de Deodoro levaram a crises econômicas, políticas e militares.
O ministro da fazenda, nomeado
por Deodoro, Rui Barbosa procurou incentivar a criação de empresas industriais
e comerciais no país. Para atingir seu objetivo, o ministro da fazenda permitiu
a emissão de uma grande quantidade de papel moeda que seria usado para
facilitar o crédito a todos que tivessem interesse em desenvolver a indústria e
o comercio no Brasil. No entanto, a facilidade do crédito favoreceu o
surgimento de inúmeras empresas fantasmas (que só existem no papel), cujas
ações eram vendidas na bolsa de valores e se valorizavam sem nenhuma
fiscalização do governo. Acreditando fazer um ótimo negócio, os investidores
compravam essas ações baratas esperando revende-las no período de altas, assim,
os falsos empresários duplicavam seus lucros, conseguindo os empréstimos com
facilidade e tirando o dinheiro dos investidores sem investir em empresas
reais. Além de não promover o avanço industrial no país, o papel moeda
produzido sem lastro (valores em produtos e ouro que justifiquem o valor em
papel) gerou uma grave desvalorização da moeda brasileira (Contos de Réis),
afastaram os investidores que sofreram golpes, provocou a falência de empresas
e bancos e esvaziaram os cofres públicos.
Entre 1890 e 1891, políticos de
todo o país se reuniram para criar a primeira constituição republicana do
Brasil. A constituição brasileira procurou referencias na constituição dos EUA
defendendo ideais liberais. Entre os principais pontos dessa constituição
estão:
- O Brasil
seria chamado de Estados Unidos do Brasil;
- Federalismo
(Autonomia para os Estados);
- Voto: Homens,
21 anos, alfabetizados, aberto, sem necessidade de comprovação de renda;
- Mandato
presidencial de 4 anos sem direito a reeleição;
- Separação
entre Estado e Igreja (documentos oficiais de nascimento, casamento e
óbito);
- Eleições
separadas entre o Presidente e o Vice-presidente;
- Estabelece
a existência dos 3 poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário).
O fracasso do encilhamento e a
nomeação de conservadores e monarquistas para cargos ministeriais republicanos
causaram uma crise política no Brasil onde o presidente passou a sofrer uma
forte oposição do congresso. Sem liberdade para atuar como gostaria, Deodoro
decide fechar o congresso no dia 3 de novembro de 1891, anunciando uma revisão
da constituição. A ação autoritária do marechal irritou setores da elite
nacional e da marinha brasileira que iniciou a primeira revolta da armada. Sob
a liderança do almirante Custódio de Melo, os navios amotinados São Paulo e
Minas Gerais, apontaram seus canhões para a cidade do Rio de Janeiro exigindo a
renúncia de Deodoro ao cargo de presidente. Receando uma guerra civil, Deodoro
renuncia em 23 de novembro de 1981, passando a presidência para seu vice, o
também marechal, Floriano Peixoto.
Após a renúncia de Deodoro,
Floriano buscou em seu governo (1891-1894) combater os estragos econômicos
gerados pela política do encilhamento, buscou apoio popular reduzindo impostos
sobre itens de primeira necessidade como alimentação e habitação e buscou o
apoio dos cafeicultores paulistas através da distribuição de cargos
ministeriais e públicos. Mesmo assim, Floriano teve que encarar uma forte
oposição no congresso e entre os militares. A forma rigorosa com a qual
Floriano lidava com seus inimigos políticos e militares rendeu a ele o apelido
de “Marechal de Ferro”.
Discussões acerca de como a
república deveria ser montada levaram a uma guerra civil no sul do país
conhecida como Revolução Federalista (1893-1895). De um lado, os republicanos
(pica-paus), que defendiam um poder forte e centralizado aos moldes do
presidencialismo exercido por Floriano Peixoto. Do outro lado, os federalistas
(maragatos), que defendiam o parlamentarismo no Brasil encerrando o
presidencialismo. O movimento parlamentarista recebe o apoio da cidade
catarinense de Desterro, onde Floriano prende os líderes e modifica o nome da
cidade para Florianópolis. A revolução só chega ao fim em 1895, já durante o
governo de Prudente de Moraes (1894 – 1898), quando o presidente civil consegue
assinar um acordo de paz com os Federalistas.
Descontentes com a participação
do exército brasileiro na política nacional, oficiais da marinha e grupos
oligárquicos se rebelaram e, assim como na 1ª Revolta da Aramada, exigiram a
renúncia do marechal Floriano ao cargo de presidente da república. Portanto,
Floriano, munido do apoio dos cafeicultores paulistas, conseguiu dinheiro para
comprar fragatas americanas e contratar mercenários que, ao chegar no Brasil,
derrotam os marinheiros rebelados. A vitória sobre os marinheiros ajudou a
consolidar a república no Brasil e o governo do marechal que exilou os oficiais
insurgentes no Acre e fuzilou marinheiros que participaram da revolta. Esse
episódio ficou conhecido como a 2ª Revolta da Armada.
A República das
Oligarquias (1894 – 1930)
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A Formula Democrática: Charge publicada em 1925 pelo jornal "Careta". A charge demonstra o poder de São Paulo e Minas Gerais sobre os rumos da presidência. |
Oligarquia (poder exercido por
poucos). Enquanto a república da espada se preocupava em conter os movimentos
contrários ao modelo republicano adotado, a elite cafeicultora paulista se
preparava para assumir o poder. Apoiado por Floriano Peixoto, o paulista
Prudente de Moraes ganhou a primeira eleição direta do Brasil que foi carregada
de grandes fraudes e manipulações políticas características do período
oligárquico da república. Com o início do governo civil, começou também o
período do Coronelismo.
O título de coronel surgiu ainda
no período regencial e era dado a grandes fazendeiros que patrocinavam a Guarda
Nacional. Esses fazendeiros eram responsáveis pela segurança das fazendas
dentro da sua área de influência, rendendo poderes excepcionais a esses
coronéis. Exercendo o poder local de fato, os coronéis, controlavam as eleições
transformando suas áreas de influência em currais eleitorais. Após a
constituição de 1891, que acabou com o voto censitário ($$$), a quantidade de
eleitores cresceu muito, no entanto, vítimas da pobreza, esses eleitores eram
facilmente manipulados pelos coronéis que acompanhavam as sessões de voto
aberto. Entre as principais formas que os coronéis usavam para controlar o voto
estão:
- Violência:
Os eleitores eram constantemente hostilizados pelos coronéis, e caso não
cooperassem com o candidato, sofriam com espancamentos e até mesmo
execuções de familiares.
- Voto de
Cabresto: Os coronéis ofereciam aos eleitores vários favores (alimentos,
remédios, roupas, empregos, etc.) em troca do voto no candidato
determinado.
- Fraudes
Eleitorais: Além da compra de votos (voto de cabresto), as fraudes eram
muito comuns, votos de crianças, de pessoas inexistentes e até mesmo
mortos eram computados como votantes válidos.
- Manipulação
de Urnas: Se mesmo depois das fraudes, das ameaças e do cabresto o
coronel não estava seguro dos resultados, roubos de urnas, desaparecimento
e multiplicação de votos também eram métodos usados pelos coronéis para
garantir sua vitória na eleição.
A Política do Café
Com Leite
Na busca por votos um pacto foi
estabelecido pelos coronéis, governadores e candidatos à presidência da
República. Enquanto os coronéis forneciam os votos para os governadores, os
governadores forneciam os votos para os presidentes, em troca, os governadores
recebiam apoio político do governo federal e uma relativa autonomia que
garantia a permanência do controle das elites sobre o estado, já os coronéis
recebiam uma grande quantidade de verbas e vários benefícios como a prioridade
de obras estruturais próximas às fazendas de tais coronéis. Essa manipulação
dos votos ficou conhecida como a Política dos Governadores.
A política dos governadores
criou uma aliança entre presidentes, coronéis e governadores garantiu um
domínio político dos estados com o maior número de coronéis e eleitores. São
Paulo (maior produtor de café) e Minas Gerais (maior produtor de leite) criaram
a política do café com leite, onde os candidatos representariam as políticas
dos dois estados. Com o predomínio do Café, todas as políticas adotadas pelos
presidentes visavam beneficiar essa parcela da elite brasileira, isso ficou
muito claro com o Convênio de Taubaté. A cada ano o Brasil batia recordes de
produção de café, chegando ao ponto da quantidade de café produzido ser maior
que a quantidade de café consumido, assim, o preço do café caia a cada ano
dando prejuízo aos cafeicultores. Reunidos em Taubaté no Estado de São Paulo,
os cafeicultores assinaram um documento que sociabilizava as perdas, ou seja,
repartia o prejuízo do café com os demais cidadãos. O Governo ficaria
responsável por comprar, com o dinheiro dos impostos, a produção excedente, diminuindo
a quantidade de café no mercado, aumentando o preço de café.
O “Boom” da Borracha
Nem só de café viveu a primeira
república, outros produtos agrícolas eram exportados pelos coronéis
brasileiros, principalmente o cacau e o açúcar. Porém, o único produto que
chegou próximo de rivalizar com o café brasileiro no quesito exportação foi a
borracha. A borracha já era extraída das seringueiras amazonenses desde a época
do primeiro reinado, porém, foi só no século XX que ela chegou ao seu auge. Com
o crescimento industrial europeu após a 2ª revolução industrial, a borracha
passou a ser item essencial, pois era largamente utilizada em produtos (como
nos automóveis) e no maquinário. Assim, o consumo de borracha subiu
vertiginosamente e, obviamente, os preços enriquecendo os coronéis amazonenses
que iniciaram a construção de uma belle époque amazônica. Entretanto, o sonho
amazonense de superar o café paulista foi frustrado pela pirataria biológica
promovida por holandeses e ingleses. Esses países conseguiram levar mudas para
suas colônias na Ásia que passaram a ser os principais fornecedores de borracha
para a Europa.
Imigração, Indústria
e Urbanização
Mesmo antes da proclamação da
república, o governo brasileiro buscou incentivar a imigração europeia para o
Brasil. O objetivo era modernizar o país e branquear a população (acreditava-se
que quanto mais branca a população, mais civilizado é o país). Assim, muitos
europeus chegaram ao Brasil para trabalhar nas lavouras de café e na tímida
industrialização empreendida no país. A maioria dos imigrantes vinham de países
ainda majoritariamente agrários na Europa, como Espanha, Portugal e Itália. No
início do século XX, também chegaram ao Brasil um grande número de japoneses e
libaneses, diversificando a cultura brasileira, principalmente a paulista. A
vida desses imigrantes nas fazendas não era fácil, os coronéis ainda
acostumados com o trabalho escravo, tratavam esses imigrantes como tal. Em
virtude disso, muitos deles abandonaram as fazendas e partiram para as cidades,
em busca de melhores condições no trabalho industrial.
Apesar do fracasso da política
do encilhamento, as indústrias cresceram no país, especialmente na cidade de
São Paulo. Esse crescimento não previsto pelo governo oligárquico tem como
principais motivos o excesso dos capitais gerados pelo café e os esforços da
indústria europeia em se prepararem para a 1ª Guerra Mundial. De um lado, os
barões do café haviam acumulado tantas riquezas que não sabiam mais no que
investir, assim, redirecionaram seus capitais para o setor industrial, e como
São Paulo era a capital do café, também se tornou a capital industrial do
Brasil. Do outro lado, como as indústrias europeias se voltaram para as
necessidades bélicas dos países em eminente guerra (e também durante ela), o
ritmo de importações para o Brasil diminuiu muito, portanto, para substituir o
mercado europeu, os cafeicultores recorreram a criações industriais próprias e
aos EUA.
Com os investimentos do café na
indústria e com os imigrantes fugindo dos abusos dos coronéis para as cidades,
não havia possibilidade das principais cidades do país não crescerem, mesmo
assim, somente na década de 1970 o Brasil passou a contabilizar uma população
urbana maior que a população rural. O crescimento populacional urbano não foi acompanhado
por políticas de planejamento, muito menos de habitação. Assim, essa massa
migratória para cidade teve que recorrer principalmente a cortiços (casarões
ocupados por várias famílias) e a bairros operários (bairros mal planejados que
eram feitos para minimizar o tempo de viagem do trabalhador até a fábrica,
assim, os trabalhadores poderiam fazer turnos maiores de trabalho).